Mudança de estilo de vida e hábitos alimentares interferem no cotidiano do paciente com câncer

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Autores do artigo original:

Rebecca J. Beeken, Helen Croker, Maggie Heinrich, Lee Smith, Kate Williams, Allan Hackshaw, John Hines, Michael Machesney, Madhavan Krishnaswamy, Sharon Cavanagh, Rebecca Roylance, Alison Hill, Kathy Pritchard-Jones, Jane Wardle, Abigail Fisher.

 

Comentários do artigo por:

Dr. André da Silva Santos – Diretor do COIP CRM-SP: 111.622

Oncologia clínica e nutrologia • Especializado em metabologia e genômica nutricional

Dra. Sandra Maria Matta • CRN3-35.281

Nutrição clínica • Especializada em oncologia e genômica nutricional

 

 

O intuito deste estudo que alocou 700 pacientes divididos em dois braços 1:1 é mostrar que os comportamentos de saúde positivos, como atividade física regular e dieta saudável, têm efeitos significativos nos desfechos de pacientes diagnosticados com câncer, por meio de intervenções simples e eficazes1. Essa mudança de comportamento pode ser incluída de forma complementar ao tratamento do câncer. Os comportamentos de saúde negativos, como tabagismo, má alimentação e baixos níveis de atividade física, são fatores de risco estabelecidos para o desenvolvimento da doença.

 

Com o crescente número de evidências na literatura a respeito dessa temática, é possível inferir que há uma íntima relação dessas mudanças de comportamento com a sobrevida dos pacientes após o diagnóstico da doença2-8. É importante salientar que até mesmo pesquisas envolvendo oncogênese mostram fatores epigenéticos como responsáveis por erros de metilação em determinados cromossomos, onde mais uma vez a relevância de um estilo de vida saudável é importante, pois minimiza esses erros metabólicos/genéticos9.

 

O peso dessas evidências da literatura levou a declarações de consenso quanto à mudança no estilo de vida para pacientes com câncer10-12. A mais notável dessas recomendações são as propostas pelo Fundo Mundial de Pesquisa do Câncer (WCRF) que recomenda a tais pacientes seguirem diretrizes para prevenir a doença, incluindo sugestões de dieta, atividade física, consumo de álcool, tabaco e peso corporal12. Tais recomendações incentivam um comportamento com rotinas diárias, a fim de se tornar cada vez mais automático em resposta a uma sugestão contextual específica.

 

Tal abordagem visa a mudanças a longo prazo, por meio de materiais impressos entregues aos pacientes após terem sido orientados por toda a equipe multiprofissional. O informe Healthy habits for life(Hábitos saudáveis para a vida) é uma breve intervenção utilizada com base no índice de risco no comportamento de saúde composto (CHBRI) ao longo de três e seis meses em pacientes com diagnósticos de cânceres de mama, colorretal e de próstata1.

 

O recrutamento foi planejado ao longo de 18 meses pelo National Health Service Trustem Londres e Essex. Trata-se de uma avanço importante para o campo científico, embora um estudo recente tenha demonstrado que a conscientização dos oncologistas quanto a esse tipo de abordagem é subótima13.

Pesquisas anteriores também mostraram que a maioria dos pacientes com câncer não está cumprindo tais recomendações14, porém gostaria de receber conselhos sobre como implementar mudanças positivas no estilo de vida15. Portanto, é necessário explicar e fornecer recomendações efetivas de maneira econômica, simples e acessível a todos.

 

Uma série de estudos realizados nos Estados Unidos, Canadá e Austrália demonstrou que tais intervenções no estilo de vida em pacientes com cânceres de próstata, mama e colorretal são aceitáveis e podem maximizar ainda mais o sucesso do tratamento16,17.

 

Neste estudo, por meio da intervenção Hábitos saudáveis para a vida, os pacientes foram aconselhados especificamente sobre comportamento em nove áreas-alvo nas quais lhes foi permitido estabelecer metas descritas a seguir:

  1. Manter-se diariamente ativo fisicamente por 30 minutos ou mais (meta mínima de 10 mil passos por dia).
  2. Ganhar força e aptidão (fazendo exercícios de força, equilíbrio e alongamento, duas vezes por semana, e duas sessões de 30 minutos de exercícios vigorosos por semana).
  3. Aumentar a ingestão de frutas e vegetais (cinco porções ou mais por dia, principalmente vegetais).
  4. Maximizar o uso de fibras (escolha de cereais integrais e adição de frutas, legumes e verduras às refeições).
  5. Não consumir alimentos nem bebidas com alto teor de calorias (reduzir gordura e açúcar e cortar bebidas açucaradas).
  6. Reduzir a ingestão de carne vermelha (não mais que 500 g ao longo da semana).
  7. Reduzir a ingestão de carne processada.
  8. Abandonar o uso de tabaco.
  9. Reduzir significativamente o consumo de álcool.

 

Essa intervenção é uma abordagem inovadora e visa melhorar o comportamento da saúde em pessoas com diagnóstico de câncer, com base na teoria do hábito e fornecendo conselhos sobre um estilo de vida saudável pautado em evidências.

 

Tais evidências reforçam que breves intervenções baseadas em hábitos saudáveis podem encorajar mudanças positivas no comportamento do paciente, em que atividade física e dieta são válidas para toda a população, incluindo adultos mais velhos e pacientes com obesidade18-20.

 

O potencial é enorme em atender à necessidade identificada de uma intervenção que pode ocorrer mediante a entrega de conceitos em forma de um livreto para tratamento complementar do câncer sem custos proibitivos. Espera-se que a discussão sobre essa medida encoraje o envolvimento do paciente e possa ser replicada por um profissional de saúde no final do tratamento. Além disso, tal intervenção pode ser incorporada ao programa de viver com e além do câncer introduzido em 2014, que inclui clínicas de saúde e bem-estar, com discussões de contextos e cuidados com os pacientes.

 

Os resultados deste estudo avaliarão o impacto de hábitos saudáveis para a vida no comportamento (um desfecho intermediário) ao longo de três meses e fornecerão informações se quaisquer alterações forem mantidas até seis meses. Se essa breve intervenção for capaz de promover um comportamento sustentado de mudanças, isso fornecerá a base para um protocolo clínico definitivo, randomizado, pragmático, de larga escala e abrangência nacional, para examinar os efeitos da adoção do programa na rotina dos cuidados clínicos sobre os desfechos do câncer. Em conjunto, poderá, portanto, contribuir de forma custo-efetiva a melhorar a sobrevida em longo prazo de pessoas diagnosticadas com câncer.

 

Tais resultados serão divulgados em conferências e reuniões científicas relevantes, revisados por pares e submetidos à publicação em revistas científicas no primeiro semestre de 2018.

 

Apesar de não terem sido publicados ainda, os resultados preliminares foram comemorados de forma positiva no último congresso da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) em 2017, por Dr. Daniel Hayes, presidente dessa instituição, que enfatizou a importância de adotar um estilo de vida saudável mesmo após o diagnóstico da doença.

 

Um ponto de grande relevância desse estudo é que em breve poderão ser relatadas taxas de respostas mediante comparação de marcadores tumorais e exames de imagens, de acordo com esse novo padrão integrativo e complementar de tratamento do câncer.

 

 

 

 

 

Referências bibliográficas

  1. BEEKEN, R. J. et al. Study protocol for a randomised controlled trial of brief, habit-based, lifestyle advice for cancer survivors: exploring behavioural outcomes for the Advancing Survivorship Cancer Outcomes Trial (ASCOT). BMJ Open, v. 6, n. 11, p. e011646, 2016.
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  8. MAYNE, S. T. et al. Alcohol and tobacco use prediagnosis and postdiagnosis, and survival in a cohort of patients with early stage cancers of the oral cavity, pharynx, and larynx. Cancer Epidemiol. Biomark. Prev., v.18, n. 12, p. 3368-3374, 2009.
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